3 de mar. de 2024

Falta de empatia é genético?

Entenda mais sobre os Comportamentos Sociais e a Cognição Social

Fundadora & Psicoterapeuta

Sandy Almeida

3 de mar. de 2024

Falta de empatia é genético?

Entenda mais sobre os Comportamentos Sociais e a Cognição Social

Fundadora & Psicoterapeuta

Sandy Almeida

3 de mar. de 2024

Falta de empatia é genético?

Entenda mais sobre os Comportamentos Sociais e a Cognição Social

Fundadora & Psicoterapeuta

Sandy Almeida

Podemos justificar falta de empatia a partir de questões biológicas? Caso sim, então é possível justificar pelo fisiológico as dificuldades para se colocar na perspectiva do outro, incapacidade para interpretar os efeitos dos nossos comportamentos ou problemas em relacionamentos, certo?  Já se perguntou de onde vem essa “inadequação social” ou como você pode lidar melhor com ela?

Os comportamentos sociais, segundo Skinner (1953) são entendidos como comportamentos de duas ou mais pessoas, em relação uma à outra, ou em conjunto, em relação com o ambiente. Estudar comportamento social e a relações sociais é compreender que diferentes respostas podem conseguir o mesmo efeito e a mesma resposta pode conseguir efeitos diferentes. 

Paremos para pensar por um momento e vamos refletir sobre os nossos comportamentos. Nos mais diversos contextos onde você se comporta, consegue reconhecer que os atos se alteram ou têm funções diferentes? Eu, por exemplo, costumo usar gírias com amigos da minha cidade natal que nunca são bem interpretadas quando aplicadas na cidade que vivo atualmente, então preciso selecionar quais expressões uso em cada contexto.

Entende-se que isso tem um aspecto comportamental, sendo selecionado pela história de vida de cada pessoa e pela cultura na qual ela está inserida, esses seriam dois dos três aspectos analisados para a compreensão do comportamento. Skinner (1999) explicou que o comportamento é produto de três tipos ou níveis de variação e seleção: filogenética, ontogenética e cultural. A seleção filogenética compreende o efeito da seleção natural sobre os organismos, a partir de sua carga genética e biológica. A seleção ontogenética nos possibilita entender os efeitos do condicionamento operante, ou seja, como o repertório comportamental de cada pessoa se molda a partir de suas experiências de aprendizagem ao longo da vida. Por fim, a seleção cultural abrange o estudo de como o indivíduo é influenciado pelo ambiente social no qual está inserido.

A partir dessas informações, voltando para a nossa questão inicial, onde entraria o aspecto biológico na parte social? Para isso, precisamos nos voltar para o nível de seleção filogenético do comportamento, entendido pelas bases biológicas que envolvem a escolha de respostas comportamentais, nas quais obviamente a genética tem sua grande parcela de influência já que estamos falando de questões neurofisiológicas. Assim, para compreender melhor esse assunto, o conceito de Cognição Social abrangeria as bases fisiológicas para o Comportamento Social, permitindo um certo mapeamento desse nível de seleção.

A Cognição Social seria a habilidade de reconhecer, compreender e discriminar os comportamentos dos outros. Ela estaria dentro do grupo denominado de Hot Cognition (cognição quente), responsável pelo processamento emocional e motivacional. A Cognição Social envolve um processo neurobiológico que nos possibilita a interpretação das condutas sociais em geral, extremamente flexíveis e diversas. Segundo Adolphis (2001), consiste na capacidade de identificação, manipulação e adequação do comportamento a partir de informações socialmente relevantes colhidas pelo sujeito.

Quando entendemos o que é a cognição social e quais seriam as consequências de possíveis déficits nessa área, temos a possibilidade de compreender a nível filogenético (biológico) comportamentos como: não conseguir interpretar como nossos comportamentos podem afetar os outros; não conseguir levar em conta as emoções e pensamentos dos outros, agindo de forma pouco empática; privilegiar nossa perspectiva em detrimento do outro.

Certo, depois de termos discutido tudo isso, como podemos solucionar as nossas perguntas iniciais? Acredito que a resposta que estamos procurando seria “explica, mas não justifica”. Essa é uma expressão que se aplica bem ao que queremos defender, no sentido de que um dos níveis de seleção do comportamento (o filogenético) pode influenciar na forma que nos comportamentos socialmente, mas ele é apenas um dos três níveis, então resumir a análise colocando a responsabilidade no biológico a colocaria como incompleta. 

Não é certo, ética ou teoricamente, justificar inadequações sociais, ou agir como um egoísta, apenas com a desculpa de que “é porque a minha base biológica está com déficits”. Temos formas de moldar e modelar os nosso comportamentos, adequando-os aos ambientes culturais e sociais que estamos inseridos, uma boa forma disso são os treinos comportamentais e cognitivos. 

O comportamento, enquanto interação, gera alterações nele próprio, no ambiente e no sujeito, modificando inclusive o sistema nervoso dele. Então, não, você não é indiferente ou inadequado por causa da genética, ela pode até influenciar, assim como os outros níveis de seleção. Mas no fim das contas somos mutáveis, podemos nos moldar e sermos modelados, basta nos comprometermos com isso! 

Uma forma de desenvolver essas mudanças sociais é através de treinos de novos repertórios em habilidades sociais, aprimorando comportamentos sociais que são valorizados na cultura em que você está inserido, com alta probabilidade de resultados favoráveis e contribuindo para um desempenho socialmente satisfatório com outras pessoas. Para isso você pode buscar ajuda profissional, visando desenvolver a “automonitoria”, que Del Prette (2021) define como uma habilidade metacognitiva e comportamental de observar, descrever, interpretar e regular pensamentos, sentimentos e comportamentos em situações sociais. Pare de culpar a sua genética e passe a ser mais assertivo à medida que você aprende isso, entendendo que seus comportamentos também são causa além de só consequência.


Autor

Sandy Brena Cardozo de Almeida, Psicóloga Clínica CRP 11/17057. Pós-graduanda em Neuropsicologia com formação em reabilitação cognitiva pela Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) e em Terapia de Aceitação e Compromisso pelo Centro Brasileiro de Ciência Comportamental Contextual (CECONTE).


Referências bibliográficas

DEL PRETTE A., DEL PRETTE, Z.A.P. (2017). Competência Social e Habilidades Sociais: Manual Teórico-prático. Petrópolis: Editora Vozes, 252 p.

DUCLOS, H. et al.Impairment of social cognition in neurological diseases. Revue Neurologique, [s.l.], v. 174, n. 4, p.190-198, abr. 2018. Elsevier BV. http://dx.doi.org/10.1016/j.neurol.2018.03.003.

FUENTES, D.; MALLOY-DINIZ, L.F.; CAMARGO, C.H.P. & COSENZA, R.M. Neuropsicologia: teoria e prática. São Paulo: ArtMed, 2008.

MALLOY-DINIZ, L. F., Fuentes, D., Mattos, P., & Abreu, N. (2010). Avaliação Neuropsicológica. Porto Alegre: Artmed.

LAURENTI, Carolina; LOPES, Carlos E.; ARAUJO, Saulo F. (Org.). Pesquisa Teórica em Psicologia: Aspectos Filosóficos e Metodológicos. São Paulo: Hogrefe, 2016.

SANTANA, Luiz Henrique; SEIXAS, Aline Maués F. de F.. A psicologia pode ser uma ciência do cérebro? Revista Perspectivas: em análise do Comportamento, Sao Paulo, v. 03, n. 01, p.24-31, 2012.

SKINNER, B. F. Ciência e Comportamento Humano. Brasília: Ed. UnB/ FUNBEC, (1953), 1970.

SKINNER, B. F. (1999). Can psychology be a science of mind? Cumulative Record – Definitive Edition. Acton, Mass.: Copley Publishing Group. Publicado originalmente em 1990, na American Psychologist, 45 (11): 1206-1210. Tradução disponível em http://www.itcrcampinas.com.br/pdf/skinner/A_Psicologia_pode_ser_uma_ciencia_da_mente.pdf

KUMFOR, F; HONAN, C; MCDONALD, S; HAZELTON, J; HODGES, J; PIGUET, O. Assessing the social brain in dementia: Applying TASIT-S. CORTEX. V. 93, p.166-177. 2017.

Podemos justificar falta de empatia a partir de questões biológicas? Caso sim, então é possível justificar pelo fisiológico as dificuldades para se colocar na perspectiva do outro, incapacidade para interpretar os efeitos dos nossos comportamentos ou problemas em relacionamentos, certo?  Já se perguntou de onde vem essa “inadequação social” ou como você pode lidar melhor com ela?

Os comportamentos sociais, segundo Skinner (1953) são entendidos como comportamentos de duas ou mais pessoas, em relação uma à outra, ou em conjunto, em relação com o ambiente. Estudar comportamento social e a relações sociais é compreender que diferentes respostas podem conseguir o mesmo efeito e a mesma resposta pode conseguir efeitos diferentes. 

Paremos para pensar por um momento e vamos refletir sobre os nossos comportamentos. Nos mais diversos contextos onde você se comporta, consegue reconhecer que os atos se alteram ou têm funções diferentes? Eu, por exemplo, costumo usar gírias com amigos da minha cidade natal que nunca são bem interpretadas quando aplicadas na cidade que vivo atualmente, então preciso selecionar quais expressões uso em cada contexto.

Entende-se que isso tem um aspecto comportamental, sendo selecionado pela história de vida de cada pessoa e pela cultura na qual ela está inserida, esses seriam dois dos três aspectos analisados para a compreensão do comportamento. Skinner (1999) explicou que o comportamento é produto de três tipos ou níveis de variação e seleção: filogenética, ontogenética e cultural. A seleção filogenética compreende o efeito da seleção natural sobre os organismos, a partir de sua carga genética e biológica. A seleção ontogenética nos possibilita entender os efeitos do condicionamento operante, ou seja, como o repertório comportamental de cada pessoa se molda a partir de suas experiências de aprendizagem ao longo da vida. Por fim, a seleção cultural abrange o estudo de como o indivíduo é influenciado pelo ambiente social no qual está inserido.

A partir dessas informações, voltando para a nossa questão inicial, onde entraria o aspecto biológico na parte social? Para isso, precisamos nos voltar para o nível de seleção filogenético do comportamento, entendido pelas bases biológicas que envolvem a escolha de respostas comportamentais, nas quais obviamente a genética tem sua grande parcela de influência já que estamos falando de questões neurofisiológicas. Assim, para compreender melhor esse assunto, o conceito de Cognição Social abrangeria as bases fisiológicas para o Comportamento Social, permitindo um certo mapeamento desse nível de seleção.

A Cognição Social seria a habilidade de reconhecer, compreender e discriminar os comportamentos dos outros. Ela estaria dentro do grupo denominado de Hot Cognition (cognição quente), responsável pelo processamento emocional e motivacional. A Cognição Social envolve um processo neurobiológico que nos possibilita a interpretação das condutas sociais em geral, extremamente flexíveis e diversas. Segundo Adolphis (2001), consiste na capacidade de identificação, manipulação e adequação do comportamento a partir de informações socialmente relevantes colhidas pelo sujeito.

Quando entendemos o que é a cognição social e quais seriam as consequências de possíveis déficits nessa área, temos a possibilidade de compreender a nível filogenético (biológico) comportamentos como: não conseguir interpretar como nossos comportamentos podem afetar os outros; não conseguir levar em conta as emoções e pensamentos dos outros, agindo de forma pouco empática; privilegiar nossa perspectiva em detrimento do outro.

Certo, depois de termos discutido tudo isso, como podemos solucionar as nossas perguntas iniciais? Acredito que a resposta que estamos procurando seria “explica, mas não justifica”. Essa é uma expressão que se aplica bem ao que queremos defender, no sentido de que um dos níveis de seleção do comportamento (o filogenético) pode influenciar na forma que nos comportamentos socialmente, mas ele é apenas um dos três níveis, então resumir a análise colocando a responsabilidade no biológico a colocaria como incompleta. 

Não é certo, ética ou teoricamente, justificar inadequações sociais, ou agir como um egoísta, apenas com a desculpa de que “é porque a minha base biológica está com déficits”. Temos formas de moldar e modelar os nosso comportamentos, adequando-os aos ambientes culturais e sociais que estamos inseridos, uma boa forma disso são os treinos comportamentais e cognitivos. 

O comportamento, enquanto interação, gera alterações nele próprio, no ambiente e no sujeito, modificando inclusive o sistema nervoso dele. Então, não, você não é indiferente ou inadequado por causa da genética, ela pode até influenciar, assim como os outros níveis de seleção. Mas no fim das contas somos mutáveis, podemos nos moldar e sermos modelados, basta nos comprometermos com isso! 

Uma forma de desenvolver essas mudanças sociais é através de treinos de novos repertórios em habilidades sociais, aprimorando comportamentos sociais que são valorizados na cultura em que você está inserido, com alta probabilidade de resultados favoráveis e contribuindo para um desempenho socialmente satisfatório com outras pessoas. Para isso você pode buscar ajuda profissional, visando desenvolver a “automonitoria”, que Del Prette (2021) define como uma habilidade metacognitiva e comportamental de observar, descrever, interpretar e regular pensamentos, sentimentos e comportamentos em situações sociais. Pare de culpar a sua genética e passe a ser mais assertivo à medida que você aprende isso, entendendo que seus comportamentos também são causa além de só consequência.


Autor

Sandy Brena Cardozo de Almeida, Psicóloga Clínica CRP 11/17057. Pós-graduanda em Neuropsicologia com formação em reabilitação cognitiva pela Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) e em Terapia de Aceitação e Compromisso pelo Centro Brasileiro de Ciência Comportamental Contextual (CECONTE).


Referências bibliográficas

DEL PRETTE A., DEL PRETTE, Z.A.P. (2017). Competência Social e Habilidades Sociais: Manual Teórico-prático. Petrópolis: Editora Vozes, 252 p.

DUCLOS, H. et al.Impairment of social cognition in neurological diseases. Revue Neurologique, [s.l.], v. 174, n. 4, p.190-198, abr. 2018. Elsevier BV. http://dx.doi.org/10.1016/j.neurol.2018.03.003.

FUENTES, D.; MALLOY-DINIZ, L.F.; CAMARGO, C.H.P. & COSENZA, R.M. Neuropsicologia: teoria e prática. São Paulo: ArtMed, 2008.

MALLOY-DINIZ, L. F., Fuentes, D., Mattos, P., & Abreu, N. (2010). Avaliação Neuropsicológica. Porto Alegre: Artmed.

LAURENTI, Carolina; LOPES, Carlos E.; ARAUJO, Saulo F. (Org.). Pesquisa Teórica em Psicologia: Aspectos Filosóficos e Metodológicos. São Paulo: Hogrefe, 2016.

SANTANA, Luiz Henrique; SEIXAS, Aline Maués F. de F.. A psicologia pode ser uma ciência do cérebro? Revista Perspectivas: em análise do Comportamento, Sao Paulo, v. 03, n. 01, p.24-31, 2012.

SKINNER, B. F. Ciência e Comportamento Humano. Brasília: Ed. UnB/ FUNBEC, (1953), 1970.

SKINNER, B. F. (1999). Can psychology be a science of mind? Cumulative Record – Definitive Edition. Acton, Mass.: Copley Publishing Group. Publicado originalmente em 1990, na American Psychologist, 45 (11): 1206-1210. Tradução disponível em http://www.itcrcampinas.com.br/pdf/skinner/A_Psicologia_pode_ser_uma_ciencia_da_mente.pdf

KUMFOR, F; HONAN, C; MCDONALD, S; HAZELTON, J; HODGES, J; PIGUET, O. Assessing the social brain in dementia: Applying TASIT-S. CORTEX. V. 93, p.166-177. 2017.

Podemos justificar falta de empatia a partir de questões biológicas? Caso sim, então é possível justificar pelo fisiológico as dificuldades para se colocar na perspectiva do outro, incapacidade para interpretar os efeitos dos nossos comportamentos ou problemas em relacionamentos, certo?  Já se perguntou de onde vem essa “inadequação social” ou como você pode lidar melhor com ela?

Os comportamentos sociais, segundo Skinner (1953) são entendidos como comportamentos de duas ou mais pessoas, em relação uma à outra, ou em conjunto, em relação com o ambiente. Estudar comportamento social e a relações sociais é compreender que diferentes respostas podem conseguir o mesmo efeito e a mesma resposta pode conseguir efeitos diferentes. 

Paremos para pensar por um momento e vamos refletir sobre os nossos comportamentos. Nos mais diversos contextos onde você se comporta, consegue reconhecer que os atos se alteram ou têm funções diferentes? Eu, por exemplo, costumo usar gírias com amigos da minha cidade natal que nunca são bem interpretadas quando aplicadas na cidade que vivo atualmente, então preciso selecionar quais expressões uso em cada contexto.

Entende-se que isso tem um aspecto comportamental, sendo selecionado pela história de vida de cada pessoa e pela cultura na qual ela está inserida, esses seriam dois dos três aspectos analisados para a compreensão do comportamento. Skinner (1999) explicou que o comportamento é produto de três tipos ou níveis de variação e seleção: filogenética, ontogenética e cultural. A seleção filogenética compreende o efeito da seleção natural sobre os organismos, a partir de sua carga genética e biológica. A seleção ontogenética nos possibilita entender os efeitos do condicionamento operante, ou seja, como o repertório comportamental de cada pessoa se molda a partir de suas experiências de aprendizagem ao longo da vida. Por fim, a seleção cultural abrange o estudo de como o indivíduo é influenciado pelo ambiente social no qual está inserido.

A partir dessas informações, voltando para a nossa questão inicial, onde entraria o aspecto biológico na parte social? Para isso, precisamos nos voltar para o nível de seleção filogenético do comportamento, entendido pelas bases biológicas que envolvem a escolha de respostas comportamentais, nas quais obviamente a genética tem sua grande parcela de influência já que estamos falando de questões neurofisiológicas. Assim, para compreender melhor esse assunto, o conceito de Cognição Social abrangeria as bases fisiológicas para o Comportamento Social, permitindo um certo mapeamento desse nível de seleção.

A Cognição Social seria a habilidade de reconhecer, compreender e discriminar os comportamentos dos outros. Ela estaria dentro do grupo denominado de Hot Cognition (cognição quente), responsável pelo processamento emocional e motivacional. A Cognição Social envolve um processo neurobiológico que nos possibilita a interpretação das condutas sociais em geral, extremamente flexíveis e diversas. Segundo Adolphis (2001), consiste na capacidade de identificação, manipulação e adequação do comportamento a partir de informações socialmente relevantes colhidas pelo sujeito.

Quando entendemos o que é a cognição social e quais seriam as consequências de possíveis déficits nessa área, temos a possibilidade de compreender a nível filogenético (biológico) comportamentos como: não conseguir interpretar como nossos comportamentos podem afetar os outros; não conseguir levar em conta as emoções e pensamentos dos outros, agindo de forma pouco empática; privilegiar nossa perspectiva em detrimento do outro.

Certo, depois de termos discutido tudo isso, como podemos solucionar as nossas perguntas iniciais? Acredito que a resposta que estamos procurando seria “explica, mas não justifica”. Essa é uma expressão que se aplica bem ao que queremos defender, no sentido de que um dos níveis de seleção do comportamento (o filogenético) pode influenciar na forma que nos comportamentos socialmente, mas ele é apenas um dos três níveis, então resumir a análise colocando a responsabilidade no biológico a colocaria como incompleta. 

Não é certo, ética ou teoricamente, justificar inadequações sociais, ou agir como um egoísta, apenas com a desculpa de que “é porque a minha base biológica está com déficits”. Temos formas de moldar e modelar os nosso comportamentos, adequando-os aos ambientes culturais e sociais que estamos inseridos, uma boa forma disso são os treinos comportamentais e cognitivos. 

O comportamento, enquanto interação, gera alterações nele próprio, no ambiente e no sujeito, modificando inclusive o sistema nervoso dele. Então, não, você não é indiferente ou inadequado por causa da genética, ela pode até influenciar, assim como os outros níveis de seleção. Mas no fim das contas somos mutáveis, podemos nos moldar e sermos modelados, basta nos comprometermos com isso! 

Uma forma de desenvolver essas mudanças sociais é através de treinos de novos repertórios em habilidades sociais, aprimorando comportamentos sociais que são valorizados na cultura em que você está inserido, com alta probabilidade de resultados favoráveis e contribuindo para um desempenho socialmente satisfatório com outras pessoas. Para isso você pode buscar ajuda profissional, visando desenvolver a “automonitoria”, que Del Prette (2021) define como uma habilidade metacognitiva e comportamental de observar, descrever, interpretar e regular pensamentos, sentimentos e comportamentos em situações sociais. Pare de culpar a sua genética e passe a ser mais assertivo à medida que você aprende isso, entendendo que seus comportamentos também são causa além de só consequência.


Autor

Sandy Brena Cardozo de Almeida, Psicóloga Clínica CRP 11/17057. Pós-graduanda em Neuropsicologia com formação em reabilitação cognitiva pela Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) e em Terapia de Aceitação e Compromisso pelo Centro Brasileiro de Ciência Comportamental Contextual (CECONTE).


Referências bibliográficas

DEL PRETTE A., DEL PRETTE, Z.A.P. (2017). Competência Social e Habilidades Sociais: Manual Teórico-prático. Petrópolis: Editora Vozes, 252 p.

DUCLOS, H. et al.Impairment of social cognition in neurological diseases. Revue Neurologique, [s.l.], v. 174, n. 4, p.190-198, abr. 2018. Elsevier BV. http://dx.doi.org/10.1016/j.neurol.2018.03.003.

FUENTES, D.; MALLOY-DINIZ, L.F.; CAMARGO, C.H.P. & COSENZA, R.M. Neuropsicologia: teoria e prática. São Paulo: ArtMed, 2008.

MALLOY-DINIZ, L. F., Fuentes, D., Mattos, P., & Abreu, N. (2010). Avaliação Neuropsicológica. Porto Alegre: Artmed.

LAURENTI, Carolina; LOPES, Carlos E.; ARAUJO, Saulo F. (Org.). Pesquisa Teórica em Psicologia: Aspectos Filosóficos e Metodológicos. São Paulo: Hogrefe, 2016.

SANTANA, Luiz Henrique; SEIXAS, Aline Maués F. de F.. A psicologia pode ser uma ciência do cérebro? Revista Perspectivas: em análise do Comportamento, Sao Paulo, v. 03, n. 01, p.24-31, 2012.

SKINNER, B. F. Ciência e Comportamento Humano. Brasília: Ed. UnB/ FUNBEC, (1953), 1970.

SKINNER, B. F. (1999). Can psychology be a science of mind? Cumulative Record – Definitive Edition. Acton, Mass.: Copley Publishing Group. Publicado originalmente em 1990, na American Psychologist, 45 (11): 1206-1210. Tradução disponível em http://www.itcrcampinas.com.br/pdf/skinner/A_Psicologia_pode_ser_uma_ciencia_da_mente.pdf

KUMFOR, F; HONAN, C; MCDONALD, S; HAZELTON, J; HODGES, J; PIGUET, O. Assessing the social brain in dementia: Applying TASIT-S. CORTEX. V. 93, p.166-177. 2017.

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