
Quando tratamos da temática do luto, ainda se ouve sobre fases e superação. Mas o que seria o luto, e como ele é realmente vivenciado?
Pode-se considerar o luto como o processo psicológico de reação a uma perda significativa (Harris, 2021). Wooden (1998) menciona que envolvem alterações em sentimentos, sensações físicas, cognições e comportamentos. Segundo Parkes (1998), o luto é uma resposta saudável, com capacidade de expressão da dor, a um fator estressante: uma significativa perda. Essa perda pode ser de alguém especial, próximo ou distante; da saúde, de um animal de estimação, de um objeto, um sonho, um movimento, um bem… mas neste breve texto, conversaremos sobre a perda de alguém querido.
O luto não é linear… o modelo de fases proposto por Kubler-Ross (1998) no livro “Sobre a Morte e o Morrer”, a partir das observações sobre os principais sentimentos de pacientes que estavam em processo de morte (negação, raiva, barganha, depressão e aceitação), trouxe muitas contribuições aos estudos sobre luto. Contudo, esse modelo trouxe a muitos a compreensão de que as fases ocorrem de forma linear, sequencial e passiva, o que não se configura na realidade.
Hoje os estudiosos de luto apresentam outros modelos que consideram a complexidade da experiência de luto, como o Modelo Dual do Luto, proposto por Stroebe e Schut (1999; 2001): ora orientado para a perda (sentir as mais diversas e intensas manifestações da perda, que podem se sobrepor), ora para a restauração (reconstrução, ressignificação da perda, retomada da rotina). Uma das principais características do luto saudável é a presença de oscilação. A presença de sentimentos de raiva/tristeza após o que se consideraria “aceitação” não precisam ser vistos como uma regressão, mas como parte natural e esperada desse processo de oscilação.
Existem vários fatores que podem influenciar no processo de luto, como a personalidade do enlutado, suas experiências de vida e perdas anteriores, as circunstâncias da perda, o momento em que recebeu a notícia, a proximidade do enlutado com a pessoa que faleceu e a existência/ausência de uma rede de apoio (Franco, 2008).
Quanto ao luto complicado/prolongado/patológico (adoecimento decorrente ou associado a uma perda significativa), precisamos estar atentos a intensidade, frequência e duração das reações do enlutado à perda e buscar ajuda especializada psicológica e psiquiátrica quando necessário.
Aos que possam estar passando por um luto: não se supera uma grande perda… não se esquece, não se resolve, não se deixa de amar. O que se pode fazer é acomodar essa ausência, reaprender a viver com a presença da saudade. É, muitas vezes, honrar com memórias, carregar um legado, chorar sempre que necessário… é não negligenciar o peso da dor, nem compará-la com as dores de outras pessoas. É dar tempo ao seu processo, é ser gentil consigo mesmo ao lidar com suas emoções, é entender que elas podem parecer muito complexas, misturadas - e às vezes até contraditórias, mas é válido acolhê-las e cuidar do que for necessário. É saber que está tudo bem precisar de ajuda e pedi-la. Seja em termos práticos, com organizações, seja em terapia.
Quando uma perda envolve morte, quando temos consciência sobre a finitude, isso pode despertar ansiedade e insegurança. Mas ao explorar esses pensamentos e sentimentos em vez de evitarmos entrar em contato com eles, descobriremos algo importante que eles estão nos contando: que somos todos vulneráveis, mas também que a vida é preciosa. Sabemos o quão desafiador é olhar para a dor e também para a vida ao redor dela. (Harris, 2021)
O luto é um processo singular e importa que seja vivido, sentido e expressado. Ressignificar a vida não significa apagar a perda, mas considerá-la e aprender a conviver com a dor. Envolve adaptação a uma nova realidade. Ignorar a dor não a faz desaparecer… é importante aceitar os sentimentos naturais dessa experiência tão difícil, acomodar a saudade e, aos poucos, “fazer a próxima coisa” (Elisabeth Elliot).
Autor
Ananda Madhava Rodrigues Magalhães, Psicóloga Clínica e Hospitalar- CRP 11/13683. Especialista em Oncohematologia pela modalidade de Residência Multiprofissional HUWC/UFC/EBSERH. Pós-graduanda em Terapia de Aceitação e Compromisso pelo Centro Brasileiro de Ciência Comportamental Contextual (CECONTE).
Referências
ELLIOT, E. O sofrimento nunca é em vão. Editora Fiel, 2020.
FRANCO, M. H. P. Luto em cuidados paliativos. In: Cuidado paliativo. São Paulo: CREMESP, 2008.
HARRIS, R. When Life Hits Hard: how to transcend grief, crisis and loss with Acceptance and Commitment Therapy. Oakland: New Harbinger Publications, 2021.
KUBLER- Ross, E. Sobre a morte e o morrer. 8ª Ed., Martins Fontes. São Paulo, 1998.
PARKES, C. M. Luto: estudos sobre a perda na vida adulta (Maria Helena Franco Bromberg, Trad.). São Paulo: Summus, 1998.
STROEBE, M. e SCHUT, Henk. The dual process model of bereavement: rationale and description. Death studies, v. 23, p. 197-224, 1999.
STROEBE, M. e SCHUT, Henk. Meaning making in the dual process model of coping with bereavement. In: Meaning Reconstruction and the experience of loss, NEIMEYER, Robert (ed.), Washington DC: American Psychological Association, 2001.
WORDEN, W. W. Terapia do luto: um manual para o profissional de saúde mental. 2. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

Quando tratamos da temática do luto, ainda se ouve sobre fases e superação. Mas o que seria o luto, e como ele é realmente vivenciado?
Pode-se considerar o luto como o processo psicológico de reação a uma perda significativa (Harris, 2021). Wooden (1998) menciona que envolvem alterações em sentimentos, sensações físicas, cognições e comportamentos. Segundo Parkes (1998), o luto é uma resposta saudável, com capacidade de expressão da dor, a um fator estressante: uma significativa perda. Essa perda pode ser de alguém especial, próximo ou distante; da saúde, de um animal de estimação, de um objeto, um sonho, um movimento, um bem… mas neste breve texto, conversaremos sobre a perda de alguém querido.
O luto não é linear… o modelo de fases proposto por Kubler-Ross (1998) no livro “Sobre a Morte e o Morrer”, a partir das observações sobre os principais sentimentos de pacientes que estavam em processo de morte (negação, raiva, barganha, depressão e aceitação), trouxe muitas contribuições aos estudos sobre luto. Contudo, esse modelo trouxe a muitos a compreensão de que as fases ocorrem de forma linear, sequencial e passiva, o que não se configura na realidade.
Hoje os estudiosos de luto apresentam outros modelos que consideram a complexidade da experiência de luto, como o Modelo Dual do Luto, proposto por Stroebe e Schut (1999; 2001): ora orientado para a perda (sentir as mais diversas e intensas manifestações da perda, que podem se sobrepor), ora para a restauração (reconstrução, ressignificação da perda, retomada da rotina). Uma das principais características do luto saudável é a presença de oscilação. A presença de sentimentos de raiva/tristeza após o que se consideraria “aceitação” não precisam ser vistos como uma regressão, mas como parte natural e esperada desse processo de oscilação.
Existem vários fatores que podem influenciar no processo de luto, como a personalidade do enlutado, suas experiências de vida e perdas anteriores, as circunstâncias da perda, o momento em que recebeu a notícia, a proximidade do enlutado com a pessoa que faleceu e a existência/ausência de uma rede de apoio (Franco, 2008).
Quanto ao luto complicado/prolongado/patológico (adoecimento decorrente ou associado a uma perda significativa), precisamos estar atentos a intensidade, frequência e duração das reações do enlutado à perda e buscar ajuda especializada psicológica e psiquiátrica quando necessário.
Aos que possam estar passando por um luto: não se supera uma grande perda… não se esquece, não se resolve, não se deixa de amar. O que se pode fazer é acomodar essa ausência, reaprender a viver com a presença da saudade. É, muitas vezes, honrar com memórias, carregar um legado, chorar sempre que necessário… é não negligenciar o peso da dor, nem compará-la com as dores de outras pessoas. É dar tempo ao seu processo, é ser gentil consigo mesmo ao lidar com suas emoções, é entender que elas podem parecer muito complexas, misturadas - e às vezes até contraditórias, mas é válido acolhê-las e cuidar do que for necessário. É saber que está tudo bem precisar de ajuda e pedi-la. Seja em termos práticos, com organizações, seja em terapia.
Quando uma perda envolve morte, quando temos consciência sobre a finitude, isso pode despertar ansiedade e insegurança. Mas ao explorar esses pensamentos e sentimentos em vez de evitarmos entrar em contato com eles, descobriremos algo importante que eles estão nos contando: que somos todos vulneráveis, mas também que a vida é preciosa. Sabemos o quão desafiador é olhar para a dor e também para a vida ao redor dela. (Harris, 2021)
O luto é um processo singular e importa que seja vivido, sentido e expressado. Ressignificar a vida não significa apagar a perda, mas considerá-la e aprender a conviver com a dor. Envolve adaptação a uma nova realidade. Ignorar a dor não a faz desaparecer… é importante aceitar os sentimentos naturais dessa experiência tão difícil, acomodar a saudade e, aos poucos, “fazer a próxima coisa” (Elisabeth Elliot).
Autor
Ananda Madhava Rodrigues Magalhães, Psicóloga Clínica e Hospitalar- CRP 11/13683. Especialista em Oncohematologia pela modalidade de Residência Multiprofissional HUWC/UFC/EBSERH. Pós-graduanda em Terapia de Aceitação e Compromisso pelo Centro Brasileiro de Ciência Comportamental Contextual (CECONTE).
Referências
ELLIOT, E. O sofrimento nunca é em vão. Editora Fiel, 2020.
FRANCO, M. H. P. Luto em cuidados paliativos. In: Cuidado paliativo. São Paulo: CREMESP, 2008.
HARRIS, R. When Life Hits Hard: how to transcend grief, crisis and loss with Acceptance and Commitment Therapy. Oakland: New Harbinger Publications, 2021.
KUBLER- Ross, E. Sobre a morte e o morrer. 8ª Ed., Martins Fontes. São Paulo, 1998.
PARKES, C. M. Luto: estudos sobre a perda na vida adulta (Maria Helena Franco Bromberg, Trad.). São Paulo: Summus, 1998.
STROEBE, M. e SCHUT, Henk. The dual process model of bereavement: rationale and description. Death studies, v. 23, p. 197-224, 1999.
STROEBE, M. e SCHUT, Henk. Meaning making in the dual process model of coping with bereavement. In: Meaning Reconstruction and the experience of loss, NEIMEYER, Robert (ed.), Washington DC: American Psychological Association, 2001.
WORDEN, W. W. Terapia do luto: um manual para o profissional de saúde mental. 2. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

Quando tratamos da temática do luto, ainda se ouve sobre fases e superação. Mas o que seria o luto, e como ele é realmente vivenciado?
Pode-se considerar o luto como o processo psicológico de reação a uma perda significativa (Harris, 2021). Wooden (1998) menciona que envolvem alterações em sentimentos, sensações físicas, cognições e comportamentos. Segundo Parkes (1998), o luto é uma resposta saudável, com capacidade de expressão da dor, a um fator estressante: uma significativa perda. Essa perda pode ser de alguém especial, próximo ou distante; da saúde, de um animal de estimação, de um objeto, um sonho, um movimento, um bem… mas neste breve texto, conversaremos sobre a perda de alguém querido.
O luto não é linear… o modelo de fases proposto por Kubler-Ross (1998) no livro “Sobre a Morte e o Morrer”, a partir das observações sobre os principais sentimentos de pacientes que estavam em processo de morte (negação, raiva, barganha, depressão e aceitação), trouxe muitas contribuições aos estudos sobre luto. Contudo, esse modelo trouxe a muitos a compreensão de que as fases ocorrem de forma linear, sequencial e passiva, o que não se configura na realidade.
Hoje os estudiosos de luto apresentam outros modelos que consideram a complexidade da experiência de luto, como o Modelo Dual do Luto, proposto por Stroebe e Schut (1999; 2001): ora orientado para a perda (sentir as mais diversas e intensas manifestações da perda, que podem se sobrepor), ora para a restauração (reconstrução, ressignificação da perda, retomada da rotina). Uma das principais características do luto saudável é a presença de oscilação. A presença de sentimentos de raiva/tristeza após o que se consideraria “aceitação” não precisam ser vistos como uma regressão, mas como parte natural e esperada desse processo de oscilação.
Existem vários fatores que podem influenciar no processo de luto, como a personalidade do enlutado, suas experiências de vida e perdas anteriores, as circunstâncias da perda, o momento em que recebeu a notícia, a proximidade do enlutado com a pessoa que faleceu e a existência/ausência de uma rede de apoio (Franco, 2008).
Quanto ao luto complicado/prolongado/patológico (adoecimento decorrente ou associado a uma perda significativa), precisamos estar atentos a intensidade, frequência e duração das reações do enlutado à perda e buscar ajuda especializada psicológica e psiquiátrica quando necessário.
Aos que possam estar passando por um luto: não se supera uma grande perda… não se esquece, não se resolve, não se deixa de amar. O que se pode fazer é acomodar essa ausência, reaprender a viver com a presença da saudade. É, muitas vezes, honrar com memórias, carregar um legado, chorar sempre que necessário… é não negligenciar o peso da dor, nem compará-la com as dores de outras pessoas. É dar tempo ao seu processo, é ser gentil consigo mesmo ao lidar com suas emoções, é entender que elas podem parecer muito complexas, misturadas - e às vezes até contraditórias, mas é válido acolhê-las e cuidar do que for necessário. É saber que está tudo bem precisar de ajuda e pedi-la. Seja em termos práticos, com organizações, seja em terapia.
Quando uma perda envolve morte, quando temos consciência sobre a finitude, isso pode despertar ansiedade e insegurança. Mas ao explorar esses pensamentos e sentimentos em vez de evitarmos entrar em contato com eles, descobriremos algo importante que eles estão nos contando: que somos todos vulneráveis, mas também que a vida é preciosa. Sabemos o quão desafiador é olhar para a dor e também para a vida ao redor dela. (Harris, 2021)
O luto é um processo singular e importa que seja vivido, sentido e expressado. Ressignificar a vida não significa apagar a perda, mas considerá-la e aprender a conviver com a dor. Envolve adaptação a uma nova realidade. Ignorar a dor não a faz desaparecer… é importante aceitar os sentimentos naturais dessa experiência tão difícil, acomodar a saudade e, aos poucos, “fazer a próxima coisa” (Elisabeth Elliot).
Autor
Ananda Madhava Rodrigues Magalhães, Psicóloga Clínica e Hospitalar- CRP 11/13683. Especialista em Oncohematologia pela modalidade de Residência Multiprofissional HUWC/UFC/EBSERH. Pós-graduanda em Terapia de Aceitação e Compromisso pelo Centro Brasileiro de Ciência Comportamental Contextual (CECONTE).
Referências
ELLIOT, E. O sofrimento nunca é em vão. Editora Fiel, 2020.
FRANCO, M. H. P. Luto em cuidados paliativos. In: Cuidado paliativo. São Paulo: CREMESP, 2008.
HARRIS, R. When Life Hits Hard: how to transcend grief, crisis and loss with Acceptance and Commitment Therapy. Oakland: New Harbinger Publications, 2021.
KUBLER- Ross, E. Sobre a morte e o morrer. 8ª Ed., Martins Fontes. São Paulo, 1998.
PARKES, C. M. Luto: estudos sobre a perda na vida adulta (Maria Helena Franco Bromberg, Trad.). São Paulo: Summus, 1998.
STROEBE, M. e SCHUT, Henk. The dual process model of bereavement: rationale and description. Death studies, v. 23, p. 197-224, 1999.
STROEBE, M. e SCHUT, Henk. Meaning making in the dual process model of coping with bereavement. In: Meaning Reconstruction and the experience of loss, NEIMEYER, Robert (ed.), Washington DC: American Psychological Association, 2001.
WORDEN, W. W. Terapia do luto: um manual para o profissional de saúde mental. 2. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

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